Carta
ao meu filho:
O que escrever ao filho que
completa quinze anos? Que vida é esta? Quais os meus desejos para você? Para o
presente, o futuro...
Você chegou em um janeiro
ensolarado. Um Rio de Janeiro de praias. A cidade se calava com tantos batuques
e jogos. Quem te recebeu nas mãos pela
primeira vez, me disse: nasceu um anjo,
seu filho quase voa. Pronto: Ícaro ia se chamar. Uma homenagem àquele que
chegou (quase) voando, para vencer os obstáculos. Para a superação. Mel de
abelha e penas de gaivota fizeram belas asas para que Ícaro saísse do labirinto
de Creta e ganhasse a vida aqui fora.
Entre o mar que poderia
pesar as asas e o sol que poderia derreter a cera, Ícaro voa, para se salvar e
transpor as limitações humanas. Encanta-se com a proximidade ao sol. Brilho da
luz, calor. Engana-se com a sua capacidade de voo. Despenca-se no mar Egeu. Nada
mais humano. Nada mais revelador da tentativa de ir além.
Seria isso a adolescência?
Um querer ir além, transgredir, experimentar... Você esticou de tamanho, ganhou
as ruas de bicicleta, o ir e vir sozinho pelos calçadões, pelas areias. Os
colegas, os grupos de amigos, o desfrutar a vida de maneira solta. Vieram mais
responsabilidades, passou para a última etapa do colégio.
Suas asas continuam te
levando para espaços diferentes, com as mesmas penas e a cera com as quais
nasceu. Cabe a você cuidar das penas, no sol e na chuva. Não podem ficar tão
molhadas pelas tempestades nem tão suadas de calor. A cera precisa ser
lustrada. Esse cuidado é diário, com o corpo, a pele, os pensamentos, os sonhos,
a alma.
A liga de penas e cera
precisa ser mantida por você, com um olhar sobre essa cola que ata a vida das
asas à vida dos pés. A vida dos sonhos à vida da realidade. É só uma vida,
certo! Há uma medida sutil, mas intensa, que sustenta sua paixão pelas pessoas,
pelas coisas. Seus sonhos. Cuide dela, são suas asas!
Sua
mãe
Rio de Janeiro, dezembro 2013/janeiro
2014.
pintura:
Lucilio de Albuquerque (1877-1939)